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Guerra China-Estados Unidos chegou aos portos dos PALOP

Angola, Moçambique, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe são os países africanos de expressão oficial portuguesa com sete portos concluídos ou em projeto com financiamento chinês previsto. A sul do Sara, o estudo do CSIS identificou 46 portos com ‘influência’ chinesa.

De acordo com um estudo do CSIS – Center for Strategic & International Studies (Centro de Estudos Estratégicos Internacionais), “há, pelo menos 46 portos na África subsariana, existentes ou planeados, que estão a ser financiados, construídos e/ou operados por entidades chinesas”.

De acordo com esta análise, que o Jornal Económico consultou, a sul do Sara as entidades chinesas estiveram, estão ou querem estar envolvidas em projetos portuários de mais de duas dezenas de países africanos, desde a África do Sul à Mauritânia, do Sudão a Madagáscar, por exemplo.

Destes 46 portos identificados na África a sul do Sara, sete estão localizados nos PALOP: Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe e Cabo Verde são países em que entidades chinesas já financiaram ou pretendem financiar infraestruturas portuárias, embora nunca tenham tido ou esteja prevista intervenção na vertente de construção e/ou operação.

O CSIS refere especificamente o projeto do porto do Mindelo (Cabo Verde); porto de águas profundas de Fernão Dias (São Tomé Príncipe); portos do Caio e de Cabinda e expansão do porto do Lobito, este último já concluído (Angola); e projeto do porto de Techobanine e expansão do porto da Beira, também já concluída (Moçambique).

Na esfera da CPLP – Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, há ainda a referir a presença de entidades chinesas no porto de Bata, na Guiné Equatorial, que já foi dado como concluído.

Porquê o interesse dos chineses pelos portos?

O CSIS questiona o interesse das autoridades chinesas nos portos da África subsariana. E responde de forma detalhada: “Os portos africanos subsarianos desempenham um papel integral no projeto de Pequim da ‘Nova Rota da Seda’ (BRI – Belt and Road Initiative, a crescente rede chinesa de projetos de infraestruturas para ligar a China com a Europa, África Oriental e Sudeste Asiático). Com o lançamento da BRI em 2013, o presidente Xi procurou abrir a China a novos mercados, expandir a sua influência política de forma global e assegurar acesso e mobilidade militares entre as várias regiões. Formando a espinha dorsal da ‘Nova Rota da Seda’ chinesa, os investimentos nos portos africanos proporcionam uma porta de entrada ao comércio e desenvolvimento económico da região, consolidam o poder da China em alavancagem política e influência no continente, e conferem um ponto de apoio para as atividades da marinha do Exército Popular de Libertação [da China]”.

“O investimento chinês está presente em cerca de 17% dos 172 portos subsarianos elencados no estudo ‘2017 World Port Index’, acrescenta o referido estudo, salientando que “estes portos estão posicionados ao longo de cada uma das costas [africana, a ocidental e a oriental], proporcionando o acesso chinês às principais rotas marítimas e aos pontos de estrangulamento”.

A análise do CSIS esclarece que 16 dos portos avaliados não foram contemplados pelo ‘World Port Index’, em parte porque alguns ainda numa fase de pré-construção ou construção, ou porque terão sido iniciados só em 2017 ou depois.

Portugal também é um alvo da ‘Nova Rota da Seda’

Apesar de, obviamente, não fazer parte do estudo, Portugal também integra os objetivos da China no projeto da ‘Nova Rota da Seda’, tendo sido veiculado publicamente por diversas vezes o interesse de várias empresas chinesas na concessão do novo terminal de contentores Vasco da Gama, no porto de Sines, cujo projeto foi aprovado recentemente pelo Governo português, esperando-se para as próximas semanas a abertura do respetivo concurso público internacional.

O projeto do terminal do Barreiro, cujo futuro parece mais incerto, também foi dado como um alvo para o interesse do investimento chinês.

Mais um palco para a guerra global China/EUA

De acordo com os autores do estudo do CSIS, Judd Devermont e Catherine Chiang, “a propriedade ou operação chinesa coloca riscos imediatos aos interesses dos EUA, permitindo potencialmente à China extrair informação sensível, bloquear o governo dos EUA de aceder a territórios ou serviços (como é o acesso crítico ao porto de Djibuti City), e usar esses portos para colocar navios militares”.

“O alastramento do conhecimento técnico e operacional dos portos pela região por parte da China pode também garantir profundidade no pré-posicionamento, colocação e reabastecimento da sua frota naval, assim como em bloquear adversários em períodos de conflito”, alertam os responsáveis por esta análise.

Segundo estes autores, “é de realçar que o investimento em portos nem sempre precede o acesso militar chinês a esses portos”.

“A China, por exemplo, assegurou o direito de atracar navios militares nas Seychelles através de um acordo militar bilateral separado. De igual modo, os direitos de operação não asseguram que um governo africano irá permitir a um navio militar chinês estacionar nas suas águas. O papel das autoridades portuárias nas operações e nos contratos de aluguer [como as concessões portuárias em Portugal], assim como o relacionamento entre o governo hóspede e o estado chinês são aspetos que uma futura pesquisa irá abordar”, assegura o CSIS.

Uma das questões fundamentais de risco apontado pelo estudo é o financiamento, através do qual “a China pode candidatar-se a projetos que aprofundem os seus objetivos políticos, alimentem a corrupção e influenciem os políticos locais”, acusam os responsáveis do CSIS.

“Adicionalmente, o financiamento permite à China o favorecimento a empresas construtoras chinesas, a negociação do controlo operacional e do acesso a recursos e, potencialmente, a busca de novas concessões se os governos africanos se recusarem a cumprir com pagamentos de dívidas”, alerta o mesmo estudo.

Para o CSIS, as entidades chinesas financiaram 27 dos 46 portos estudados.

Outra vertente de preocupação é a construção, que “capacita a China a recolher informação sobre as infraestruturas portuárias, criar uma dependência da tecnologia e ‘expertise’ chinesa, e assegurar uma interoperabilidade de longo prazo com os produtos e tecnologia chinesas”.

Neste caso, as entidades chinesas supervisionaram 41 dos 46 projetos portuários avaliados na África subsariana.

Noutra vertente, as enrtidades chinesas asseguram a operação de 11 dos referidos 46 portos.

Refira-se que Judd Devermont é o diretor do ‘Africa Program’ no CSIS, em Washington D.C., enquanto Catherine Chiang é coordenadora de programas e assistente de pesquisa no mesmo departamento do CSIS.

Por seu turno, o CSIS afirma-se como uma entidade privada, isenta de impostos, com o foco na análise de temas de política internacional pública, ressalvando que todas as posições, comentários e conclusões são da exclusiva responsabilidade dos autores das mesmas.

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